sexta-feira, 22 de julho de 2011

Ai cena bandida....


A personagem não mudou... o texto e cena também não.... mas a intenção... quanta diferença.... chega de amor, eu quero é raiva, abominável!
Ok, não foi assim que o Jeam pediu, mas foi quase, vai...
Nessa noite, ele inverteu a hierarquia das emoções e não queria saber mais daquele amor todo, queria ver o circo pegar fogo e jogou a lona da raiva no picadeiro. Trabalhar com a raiva seria mais ou menos parecido com um trapézio nesse circo, onde uma vaciladinha de nada, faria o ser cair das alturas do seu clichê e se espatifar todo feito bagaço da laranja do shampoo do meu comercial que eu parafraseei no início – me peçam pra fazer o original ao vivo depois.
Finalmente, ele resolveu escolher nossas parcerias, as duplas em cena. O dedinho foi apontando e eu naquela torcida secreta, rezando pra não cair em mãos erradas, sem duplo sentido. Depois de um longo suspense, não é que eu tirei a sorte? Calhou de eu fazer dupla com um dos meus amores dos ensaios, o Harrison Reis.
Me senti ganhando um presente e olha que eu estava me preparando já pro pior antes de formar a minha dupla. Mas enfim... recapitulando, fizemos um exercício pra poder induzir as emoções que as personagens pediam... sem desviar os olhos um do outro... depois, um dos dois devia pegar no braço do outro, e então ação.... Esse primeiro exercício pra mim, não valeu muito, não senti, não surtiu efeito.... mas quando o Harrison me pegou pelos braços com as mãos cheias – entenda como apertando FORTE – aí eu senti... oh se senti... os olhos dele estavam de um jeito que eu nunca vi, nem nos ensaios – até porque trabalhamos o oposto lá – me senti fuzilada. Se pudessem ou se tivéssemos efeitos especiais, aqueles olhos pegariam fogo, e me atingiriam num raio, me fazendo virar atriz em pó....
A força que eu senti no olhar daquele homem, me mostravam que eu estava lidando com um homem, não conseguia mais ver ele como ele, ele estava fora dele mesmo, com o diabo.... digo, o personagem no corpo. E eu realmente me senti envergonhada diante dele, enquanto ele me olhava daquele jeito e dava o texto, queria abrir um buraco no chão. E isso tudo eu senti desde o primeiro minuto que ele deu o texto até o último....
Na minha vez, o exercício era outro, esse realmente me aqueceu. E eu pude berrar, crianças!!! Tudo que mamãe me proibia quando eu era pititinha, tio Jeam, deixou hihihi
É, eu berrei. E pude dar meu texto berrando.... minha garganta quase pediu pra sair, mas foi de uma libertação aquilo... não sei se os berros saíram com aquela intenção toda que eu queria, mas quando eu abaixava o tom de voz sim.... raiva, e eu tinha que estar com ela, juntou a de não poder falar pra reagir ao meu parceiro dando o texto antes, daquele olhar fuzilante, e eu carreguei o meu... se aí eu passei a intenção? Ainda não consigo sair do meu corpo e me assistir de fora... droga!
Enfim foi libertador, agoniante e empolgante. O meu parceiro, meu amor, me surpreendeu. E como eu nunca imaginei. Vi nele, a veia artística saltando. Ele sabe porque eu já disse à ele em particular, e eu faço questão de repetir que pra mim ele é a maior revelação de todos. Morri de orgulho dele e de mim, por estar lá, testemunhar, e fazer parte dessa história. É como se eu tivesse visto um menino envelhecer 10 anos e virar um homem na minha frente num piscar de olhos. Em termos de ator, foi de mirim à principal. Vi isso nos olhos dele e eles me inspiraram muito, e eu tentei respondê-los à altura.
A certeza à uma atriz não pertence. Mas sei que o acompanhei porque fui contagiada por ele e acredito que ele tenha encontrado nos meus olhos o reflexo de tudo que ele queria me passar.
E como a ópera termina? Com um casal de verdade em cena, com dois personagens juntos e misturados em uma coisa só: uma história de linhas e entrelinhas contada e compartilhada em comunhão total de atores.
Adorei no fim, que tenha se invertido a intenção e ter a prova viva de que um texto pode ser visto e trabalhado de mais de um ângulo. Envolvendo não só a cena, marcação, mas indo desde a leitura até o tom de voz. Num mesmo texto, trabalhamos seus lados opostos, os nossos opostos. E moral da história é que com isso dá pra ir até o infinito... mas sempre existirá um diretor no fim da linha pra te trazer de volta, pro chão... porque se deixar, somos capazes de voar. E com o que eu fiz, entre os ensaios e esse dia já dava pra alcançar as nuvens.... num é que tá ficando cada vez mais bom?

1 comentários:

Harrison Reis de Sousa at: 23 de julho de 2011 às 11:46 disse...

Obrigado, obrigado e obrigado. É ótimo ver o resultado de uma cena, não só vindo de você, não só do seu texto mas dos sentimentos que eles expressaram e trouxeram até a minha alma arrepiar. Você respondeu á altura sim, e sinto que tendes a melhorar, como eu, como todos. Botamos o terror!

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Making of do Making of

Making of do Making of
Eu queria falar, dizer tudo que sentia, vivia, guardar de algum jeito cada pequeno detalhe, que me transformava em uma mulher, uma Atriz. Assim, eu criei esse espaço... tão meu.... seu.... nosso.... Aqui, eu tenho a minha coxia em forma de livro... um livro aberto de minha autoria — Renata Cavalcante, 28 anos, carioca da gema, prazer.... — narrando os bastidores da minha memória viva desde a preparação de Jeam Pierre até me tornar atriz da Cia. Grito de Teatro de Santa Catarina, numa evolução que vai do querer ser profissional a ser oficialmente reconhecida como tal — o antes e o depois do DRT, aqui pra você!

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