Por dentro, eu estava contando os dias para poder vir aqui confidenciar o que aconteceu no dia em que fui gravar meu primeiro diálogo, incorporando minha persona insana non grata. Os caminhos que me levaram até esse dia e o que ele representou na minha vida abominável, inclusive o retorno disso tudo, formam o conjunto da minha obra, de maior sucesso – só perdendo pra Alice.... até porque a Alice é or concour!
Antes de tudo, antes de já chegar chegando, gravando, ensaiamos por nossa conta e risco – o Everson e eu – e tentamos construir uma cena, também por nossa conta e risco – porque em se tratando de Jeam Pierre: prepare-se para o impreparável, meu amor – além de enfrentarmos o texto mais desafiador de todos – não por densidade, profundidade – era uma grande pegadinha em forma de.... parecia um cordel... um trava-língua... um enlouquecedor de atores – e eu já era a louca heeeeeeein, oh que sortuda eu!
Decorar uma peça – não, não quis dizer montagem de teatro, daaaaaaar – dessas, realmente foi meu maior desafio, porque as falas eram curtas e completamente sem nexo – aliás pra quê?... num passa de adereço isso né Jeam Pierre? – que pediam a fala do outro, dependiam dela pra existir e era – não, não tem outra palavra... – LOUCURA!
Mas enfim, voltando... ensaiamos nessas duas semanas que tivemos – traduzindo 2 últimas confissões – ai que mentiiiiiiira!.... na realidade da situação, os planos eram lindos, mas o bicho pegou para o meu lado e o que eram duas semanas garantidas de ensaio, de encontros marcados, se resumiu a apenas dois, espremidos em uma única semana, porque na seguinte o bicho pegou pro meu lado!
Comecei a apresentar sinais – sintomas, pra ser mais franca – que me fizeram crer que eu ia dar um tiute: a virose pirou minha cabeça e o coração....? Quis morrer.... – força de expressão, é claro – desmarquei os ensaios com meu companheiro de cena, morrendo de remorso – é, eu sou dessas – e quase matei o homem do coração – ele apavorou, disse que sem mim, ele não era ninguém.... não com ESSAS palavras.... mas quis dizer.... e eu como não posso perder as oportunidades que me dão, já entrego logo.... e foi liiiiiiindo isso!
Minha garganta pegava e o meu pavor não ficava muito atrás... foi se aproximando o dia e nada... o dia chegou e eu decidi procurar um médico e o querido profissional da saúde me fez tomar o fim da picada – a própria – no bumbum mais soro na veia. Saí de lá intimada a descansar e desistir de ir gravar – não pelo médico, mas pela poderosa chefona que eu tenho em casa – e eu batia pé que me sentia bem, que estava em condições, tentava me defender do indefensável... no fim, me rendi.... – e porque estou aqui escrevendo... ainda?
Até a página vinte, foi até aí o limite dos pontinhos – minúsculos – que entreguei... depois de uma ligação e muita reflexão – incluindo a lembrança do que senti na única vez que faltei na vida – e eu já sabia que a dor de ser obrigada – mesmo que pelo bom senso – a ficar era mil vezes mais dilacerante do que a real que eu poderia sentir. Dor real, eu não sentia, mas me sentia apreensiva, e muuuuuuuito impressionada! No fim, vocês já sabem....
Eu me rendi e saí nos 45 do segundo tempo pra correr atrás do prejuízo... e eu não pensei só em mim, no quanto eu sentiria não gravar, ainda mais depois de já ter tido a oportunidade de me apresentar pra galeeeera – feelings de seu boneco, eu confesso – também pesava ter de deixar o meu companheiro na mão, ele estar lá me esperando e terminar abandonado e frustrado, não seria justo com ele, muito menos comigo, e, contra tudo e contra todos: EU FUUUUUUUUUUUUUUI – ooooowooooo.... tá, parei....
Chegando lá, jurava que estava bem e jurava que achavam o mesmo – o que é o pior – mas não era bem assim... e eu só iria descobrir depois.... no meu presente, meu agora, eu tinha um apoio e estava segura do que queria.... segura na minha insegurança – como eu mesma digo – era o meu tudo ou nada!
Deixei as cartas na mesa e fui franca com o meu companheiro, eu não estava em perfeitas condições – crianças não façam isso em casa – não sentia, mas estava impressionada, vulnerável, frágil, não era cem por cento, mas a força que eu não sei de onde eu tirei, era maior.... maior do que eu....
Ele me aceitou, sabendo disso. E a sorte estava lançada para nós dois. Observamos o jogo todo de cena mudar de figura – e não, não era pegadinha do Advogado do Diabo – as marcações mudaram em cima da hora, o cenário virou mais de um e até à figurantes – nós – e holofotes tivemos direito. O negócio era mais dinâmico e ainda engenhava a construção de uma equipe de filmagem – cameraman + apoio do cameraman + caboman+boom – todos unidos com um único objetivo: gravar sem derrubar o Jeam Pierre e passar com o boom na frente da camera.... ihhhhhh, foram dois...
Enfim, de tanta observação e entre ser figurante e parte da “equipe técnica” da coisa – cena – fomos, finaaaaalmente, fazer a coisa engrenar com a nossa cara. Chegou a nossa vez de gravar e.... faiouuuu.... entrada deu errado, fui autorizada a repetir e daí foi só correr pro abraço: cerca daqui, cerca dali, corre atrás, provoca.... e COOOOOORRRRRRRRTAAAAAAAAAAAAA! Acaba de repente e você fica pensando porque passa tão rápido? Passou.... eu não assimilei.... minha ficha não caiu.... eu só senti.... senti a maravilha que era estar ali, ter feito a minha cena, que era poderosa por ter enfrentado um mundo, e, principalmente à mim para estar ali.... que estar ali me provava do que eu era capaz pelo meu sonho de menina, eu era poderosa – super atriiiiiz ativaaaaaaaar.... não resisti...
Nas nuveeeeens... além das incertezas, inseguranças, na segurança de saber, de ser uma atriz de verdade, sem fugir da raia, jamais! Mesmo entupida e entorpecida – como disseram as más línguas por aí – eu estava presente e mais viva do que nunca em cena, eu vi isso!
Assisti de camarote e ninguém diria, sequer suspeitaria das minhas reais condições.... não antes de um longo discurso de frear qualquer perfeccionismo e estimular o espírito errante – de errar mesmo – de se arriscar sem medo, de desejar o erro, na certeza de que correr em direção à ele, nos fizesse mais humanos, mais atores.... antes que nos tornássemos múmias, enroladas nas faixas que criamos pra nos atar e sufocar no rumo da perfeição, que é de vez em sempre, inatingível.
Fomos convidados – e mais uma vez – desafiados a caçar o que tínhamos de bom, pra variar, já que o que tinha de ruim já estava sempre em pauta e estávamos ficando irritantemente repetitivos e obsessivos autocríticos. Não precisávamos de ninguém pra quebrar nossas pernas, que já tínhamos nos engessado, entendem?
Analisando com menos crueldade a nós mesmos, nos assistimos.... e eu me maravilhei com o que consegui, até minha voz afinou num ponto em que jamais se confundiria como a Alice, eu soava uma retardada completa e estava extasiada!
Ainda escutei as palavras de anjo do Diabo em forma de preparador.... “sem dúvida, esse foi o melhor vídeo da turma... da noite”.... e aí o êxtase foi total e irrestrito, o prazer não caberia nem em cinqüenta páginas – que vocês sabem muito bem que eu seria capaz de escrever.... mas eu não preciso... a felicidade dispensa palavras.... e eu me basto com essas....
Sei que se morresse ali, naquele momento, morreria.... – feliz? – sem um Oscar.... ou no mínimo.... um Melhores do Ano né, Fausto?... um Quiquito.....? Nem morta, santa!
0 comentários:
Postar um comentário